sexta-feira, 29 de novembro de 2002

CRÍTICA: POR UM FIO / Desculpe, é engano

Imagina a cena: você tá lendo isto aqui. O telefone toca e uma voz diz que, se você parar de ler, receberá um tiro que te matará na hora. O que você faz? Você mede os prós e os contras e decide que, se continuar lendo, a dor pode ser maior. Um tiro é mais rápido: morte instantânea. É mais ou menos essa a trama de “Por um Fio”, só que não tem nada a ver com leitura. É sobre um cara que atende uma ligação numa cabine telefônica, e alguém imitando o Hannibal Lecter lhe dá instruções. Ih, mas vou começar pelo começo. Ou seja, pelo título. “Por um Fio” é um nome clichê que define bem a relação filme-espectador e cai como uma luva pra 90% das produções hollywoodianas atuais (os outros 10% poderiam chamar-se “Paciência Tem Limites” e “Eu Não Agüento Mais!”), mas o título original é muito pior. Traduzido pro português, seria “Cabine Telefônica”. Olha, um filme iraniano se chamar “O Chaveiro” ou “O Bode” eu até entendo. É o tipo de cinema que eles fazem (e eu gosto). Agora, um título descritivo desses nos States é pura preguiça. O que virá a seguir, “Batedeira Elétrica”? Desculpe o preconceito, mas não consigo fantasiar o seguinte diálogo: “O que você tá indo assistir?”. O outro responde: “Cabine Telefônica”. E o primeirão: “Oba! Posso ir junto?!”.

O carinha que fica preso na cabine não é um qualquer. É o Colin Farrell, que esteve em “Demolidor” e “O Novato”. Ele é bom, mas minha preocupação é: todos os filmes daqui pra frente serão com ele? O Colin faz um agente ou empresário, não sei a diferença, que tem um celular, mas se mete numa cabine telefônica pra fazer uma ligação pra uma paquera. E o tal psicopata (voz do Kiefer Sutherland) imitando o Hannibal liga, diz que está apontando um rifle pra ele e que, se ele desligar, é um homem morto. O que o Colin precisa fazer pra se safar? Contar a verdade pra amante e pra esposa, humilhar-se em público e tornar-se uma pessoa íntegra. No fundo, no fundo, quais são os pecados dele? Ele é um chato arrogante, ele mente (Uau! Agente mente?! Depois dizem que não se aprende nada no cinema), e ele NÃO traiu a esposa – que aí seria caso pra pena de morte mesmo – mas PENSOU em traí-la. Vejamos: eu já pensei em trair o maridão? Não, acho que hoje ainda não. Mas vou parar de ser sarcástica porque, de repente, eu entro numa cabine e o Hannibal, digo, o Kiefer, liga me ameaçando. Pode acontecer com qualquer um.

Lógico que este suspense de Joel Schumacher (que não, não é o irmão menos esperto do Michael, e sim o diretor dos dois piores “Batman”) não é só isso. Prostitutas histéricas querem ocupar a cabine (elas gritam, o que me fez torcer pra que o atirador usasse seu rifle), e o Forest Whitaker entra na jogada como o detetive mais carente do mundo. A polícia do filme, por sinal, é um monumento à incompetência. Há um atirador de elite à solta, certo? Aí um homem passa com um baita de um estojo de couro, e a polícia nem pra perguntar se ele tá carregando um violoncelo ou uma bazuca?! Como o suspense não se segura, eu fiquei imaginando maneiras do filme ser melhor. Por exemplo, o atirador ameaça liquidar um rapaz se ele não ligar pra namorada, conforme prometido. Ou, sei lá, o cara que invade a cabine só aceita sair dela com a negociação do Alckmin. Ah, e se fosse um terror com a cabine telefônica como protagonista? Cansada de ter sido vandalizada 40 vezes nos últimos seis meses, a Diabólica Cabine decide mastigar o próximo mané que rabiscar “se chifre fosse flor, sua cabeça seria um jardim”. Também fiquei lembrando dos áureos tempos das cabines telefônicas no cinema. Pensei em “Os Pássaros”, no Super-Homem trocando de roupa... Não é à toa que o roteirista teve a idéia de “Por um Trim” vinte anos atrás. De fato, o filme já começa datado. A cabine do título é a última de Manhattan, e Colin será o último a usá-la. Pois é, sei que é um momento histórico, mas eu preciso acompanhar TODA a gloriosa história americana? A vantagem é que o filme tem 82 minutos, é curtinho. Principalmente das idéias.

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