quarta-feira, 27 de novembro de 2002

CRÍTICA: MÁQUINA DO TEMPO / Tempo sujeito a pancadas

Antes de “A Máquina do Tempo” começar, tentei me preparar. Perguntei ao maridão: “Se você pudesse viajar no tempo, pra onde gostaria de ir?”. E ele respondeu sem pestanejar: “Pro Nordeste”. Mal sabia ele que aquele era o tom ideal pra se entrar no clima de “Má Má”.

O filme é baseado na célebre obra de H. G. Wells, que deve estar dando umas reviravoltas no túmulo. Com um agravante: é dirigido pelo seu bisneto. A história é de um físico do século 19 que não se conforma em perder a amada e inventa uma máquina. Ele volta ao passado, só para ver sua querida sendo morta de novo. Este é o primeiro sinal de que as intenções dos produtores não batem com as nossas. A moça é atropelada por uma carruagem e eles colocam melodia trágica, o protagonista chora, etc e tal. E a gente ri. Perdão, mas é uma cena engraçada. Depois o carinha vai para uma rápida visita a 2030, e como é um sujeito culto, entra direto num museu. Nada de turismo sexual – a primeira inspeção é mesmo a um museu. Lá conhece uma enciclopédia ambulante cujo estilo de interpretação é arregalar muito os olhos. Em seguida, nosso herói viaja mais pra frente e chega numa hora ruim: a lua está desabando em cima de Nova York. Parece que o pessoal andou maltratando as colônias lunares. Fica o aviso pras gerações atuais – gente, cuidado com a lua aí. Estas são as partes boas da ficção científica. Só que o cidadão sem querer segue uns 800 mil anos, e desta vez encontra pessoas meio pré-históricas falando uma língua estranha e monstrões grunhindo. Aí tem início o verdadeiro espetáculo, e “Máquina” descamba pra comédia pastelão. O problema é que não é intencional.

A tela é inundada por uma música pavorosa que lembra a trilha de “Titanic”, só que em versão élfica e com coro infantil. Imediatamente, nosso valente cientista arranja um rabo de saia. É a única mulher do planeta, pelo jeito, e a única pessoa com cabelo. Espero que você não se decepcione ao constatar que a moda não evoluiu. A moçoila é raquítica e usa calça com cintura baixa, pra exibir seu umbigo. Seu estilo de interpretação é olhar fixo pro protagonista, com cara de babona. Ela já aparece com uma criança. O legal desses filmes de reconstrução da civilização é que o herói chega e já encontra mulher e filho pronto, nem precisa fazer. Eu entendo. Depois de tanto esforço, ele pode estar cansado e não conseguir reproduzir. O resto da população é toda Hare Krishna.

Já os monstros comedores de gente são idênticos aos de “Senhor dos Anéis”. Jeremy Irons é seu líder, mas ele está mais pra vampiro que pra bicho-papão. Ele vem de cara pálida, peruca branca e batom vermelho. Todas suas falas são pausadas, para que possamos adivinhar a próxima linha. Esta é a civilização avançada que domina o mundo?! Olha, eu até acredito. Hoje a gente não tem o Bush? Felizmente pro Jeremy, ele tem poucos minutos de filme. O mesmo não se pode dizer do protagonista Guy Pearce. Ele já mostrou seu talento em obras como “Los Angeles, Cidade Proibida” e “Amnésia”. Aqui, parece que desaprendeu tudinho. As atuações são hilárias. Ele segura o menino pelos ombros e o balança sem parar enquanto lhe pede: “Você tem que me ajudar”. O garoto leva uma flechada, põe a mão na perna e pula. Juro. Ele pula como um feijão saltador. São cenas de pura paródia, mas levadas a sério pelos realizadores. Dizem que o piá é irmão da babona na vida real. Ela é uma cantora que nunca ouvi falar e chama-se Samantha Mumba. Jumba? Mambo? Monga? Não decorei.

É esquisito que o herói possa ir pra época que quiser e resolva ficar numa terra arrasada com uma só fêmea e cheia de Krishnas. Tudo bem que é Nova York, mas...

Vendo “Má Má”, senti saudades de “Em Algum Lugar do Passado” e “De Volta para o Futuro”. Mas aprendi valiosas lições sobre nosso destino. A previsão ruim é que a escola continuará exatamente a mesma, com criancinhas ouvindo um professor. As boas novas são que, daqui a 800 mil anos, os americanos terão aprendido uma segunda língua. Vamos botar fé.

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