quinta-feira, 30 de novembro de 2006

CRÍTICA: MIAMI VICE / Velhos vícios

Lembra da série de TV “Miami Vice”? Pois é, eu também não. Pra mim é uma coisa tão anos 80... Lembro do Don Johnson usando óculos escuros e carrões envenenados, e mais nada. Mas, pra falar a verdade, acho que confundo o troço com “Chips”. Ok, peçam a minha caveira, amantes da série. Porém, o filme tem pouquíssimo a ver com o que eu não vi na TV. A única semelhança é que o diretor é o Michael Mann, que na época era produtor da série. Não sei se você sabe que os críticos babam pelo Michael, colocando “Colateral” num pedestal. Eu gosto de “Fogo Contra Fogo”, gosto de “O Informante”, mas “Colateral” é um porre. E aquelas imagens em câmera digital, marca registrada do Michael, pra mim só distraem.

De todo modo, o “Miami Vice” feito pro cinema é bom, embora um pouco cansativo. Jamie Foxx (“Ray”) e Colin Farrell (“Alexandre”) interpretam dois agentes infiltrados no mundo da droga. Os caras têm os melhores brinquedinhos que o dinheiro do contribuinte pode comprar: helicópteros, aviões, lanchas, armas de última geração e ternos bem feitos, mas não conseguem um corte de cabelo decente. E nem um barbeiro pra cortar todos aqueles pêlos faciais. Quando eu não tava me concentrando nisso, pensava na inutilidade do combate ao tráfico. Os policiais matam um traficante e imediatamente aparece outro no lugar. Enquanto houver demanda, vai haver droga. Ainda mais no que deve ser o maior mercado consumidor do mundo (tô chutando, mas o terceiro país do planeta em população é tão top de linha em tantas coisas que consumo de droga não deve ser exceção).

Outro pensamento que tomou meu tempo foi calcular quanto ganha uma alta executiva da droga, papel da Gong Li (a malvada em “Memórias de uma Gueixa”). A Gong é o tipo de atriz que só fica linda em filmes de época. Em “Miami” ela não tá exuberante como nos seus outros trabalhos, tanto que nem a reconheci. E ela não fala inglês. Teve que memorizar suas falas foneticamente, o que soa estranhíssimo. Numa superprodução que custou mais de 135 milhões de dólares, não dava pra pagar um curso superintensivo pra Gong? (legal é ouvir os críticos americanos reclamando que não conseguem entender o que ela diz). Bom, o Colin se envolve com a Gong, pro desespero de seu parceiro. E, quando o Colin diz pro Jamie que está 100% do lado da Gong, pensei que o Jamie iria gritar “Eu mato essa Yoko!”.

“Miami” tem várias cenas de sexo que matam o ritmo do filme. Mas chega uma hora em que algo explode e alguém meio importante quase morre. Isso me levou a pensar nas raras vantagens de ser gordo. Calma que preciso contar minha experiência. Semana passada um vendedor desses produtos de “Quer enriquecer? Pergunte-me como” me avisou que pessoas com gordura abdominal estão com um pé na cova. Respondi que o preconceito contra os gordos é a única forma de discriminação politicamente correta hoje em dia, porque tem até o aval da ciência, mas que, em séculos passados, a ciência também era usada pra discriminar outras pessoas, como gays e negros. Aí saí da lojinha e levei o maior tombo da minha vida. Literalmente. Tropecei num desnível de calçada e caí feio, de frente, estatelada no chão. Mas não bati a cabeça e estou aqui vivíssima pra contar a história porque tenho, hum, como direi, amortecedores naturais. E isso me deu poder, porque descobri que jamais vou bater a cabeça numa queda. Depois fiquei sabendo que a mãe de uma amiga minha foi atropelada por uma moto, jogada longe mesmo, e só sofreu alguns arranhões porque foi protegida pela sua massa corporal. Ninguém fala nisso, né? Então quando uma mulher em “Miami” sofre uma perfuração no pulmão ou algo do gênero, eu realmente fiquei pensando que, se ela fosse gordinha, os ossos não perfurariam órgãos vitais com essa facilidade. Mas a gente é massacrada diariamente pra trocar essa camada protetora de matar agentes do FBI de inveja por shakes emagrecedores de 100 reais.

Certo, certo, o filme. Outro motivo razoável pra ver “Miami” é que o Brasil é mencionado algumas vezes, se bem que não pelas suas belezas naturais. Pelo menos não é tão citado como Colômbia, Paraguai, Haiti... O pessoal também fala bastante de Cuba, mas como um lugar onde o comércio de drogas não é bem vindo (ponto pro Fidel?). Ou seja, esses países subdesenvolvidos vivem querendo invadir os EUA com drogas pesadas. Ainda bem que os americanos contam com superagentes infiltrados e acima de tudo honestos no combate ao crime. E ainda bem que o Jamie não precisa se infiltrar no meio de supremacistas arianos, porque ia ser difícil.

Um comentário:

Serge Renine disse...

Aronovich:

Aproveitei as letrinhas e li sua crônica, como prefere, do filme Miami Vice.

Como assisti muito na década de 80 resolvi dar uns pitacos para esclarecer algumas coisas.

1- O filme atual só é diferente da série nos atores e no clima mais escuro. A estória é chupada de três episódios, ou mais, diferentes da série, sendo que as falas de um personagem as vezes está na boca de outro (na série o traficante fala pro do Don Johnson “gostei de você, mas não gostei do seu amigo, não que ele responde, não viemos aqui para fazer amizade” no filme, ao contrário o traficante fala pro policial negro e várias outras situações, enfim, o filme é uma colcha de retalhos.

2- O dinheiro que os policiais gastam em carrões, aviões, roupas etc. não saem do bolso do contribuinte americano, mas sim, dos traficantes que tem seus bem apreendidos e esse bens são repassados aos policiais graças a uma lei especial anti-máfias de 1993, chamada lei RICO. No Brasil podia se fazer o mesmo.

3- Você tem toda razão: enquanto houver demanda vai haver tráfico. O traficante é um homem de negócio e se não tiver pra quem vender não haverá lucro e ele vai fazer outra coisa. Só não vê quem não quer, e as autoridades não querem ver.