quinta-feira, 29 de agosto de 2013

GUEST POST: "NÃO NOS COMPLETAMOS. NÓS DUAS SOMOS INTEIRAS"

Hoje, dia 29 de agosto, é uma data importante: o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica e Bissexual. 
É importante porque, como sabemos, lésbicas e bissexuais muitas vezes costumam ser menos visíveis até no movimento LGBT, que dizer no resto da sociedade. Por causa disso, hoje está acontecendo uma blogagem coletiva para marcar a data (aliás, a semana toda).
Pra comemorar, pedi pra uma jovem leitora, a D., escrever um guest post pra cá. Só que a espertinha passou a missão pra sua namorada, a M. E ficou uma delícia. Eu li este relato com um sorrisão nos lábios. 

A Lola convidou minha namorada (a D.) pra escrever um guest post. Acabou que sobrou pra mim. E este relato é sobre como duas saudáveis garotas de 16 anos acabam namorando. Bom, foi assim: eu e D. estudamos juntas há 2 anos e meio. Não teve nada de amor à primeira vista ou essas coisas (ela tinha um namoradinho; eu achei ela meio metida). Só que os nossos grupinhos de amizade se fundiram e a gente acabou se aproximando cada vez mais. Uma amizade bem "normal", sabe?
De amigas, nós passamos pra super amigas para sempre. Foi aí que nossa escola entrou em greve e eu fiquei um mês bem ocioso em casa. Mente vazia, oficina do diabo. Eu, que sempre duvidei da minha heterossexualidade, fiquei com muita saudade da D. E com tempo de sobra pra começar a desconfiar disso. Já fiquei com garotos, já gostei de garotos, mas ao mesmo tempo eu tinha aquela curiosidade de como seria beijar uma garota e tudo mais.
Fiz o que qualquer uma teria feito: procurei no Google. “Será que sou lésbica?”, “Como saber se sou lésbica?”, “Estou apaixonada pela minha amiga?”, “Lésbica ou bissexual?”, e daí pra frente. Entrei em mil sites, fiz mil testes (sim, existem testes), e a conclusão foi que eu muito provavelmente era lésbica. Tá, whatever. O problema foi que nesses sites sempre tinha o relato da lésbica-adolescente-que-se-descobriu-lésbica-porque-tá-apaixonada-pela-melhor-amiga. Pelos relatos deu pra sacar que, estatisticamente falando, TODA lésbica já se apaixonou por uma amiga e que, ainda estatisticamente falando, TODA vez dá merda.
Não foi uma descoberta das mais animadoras. Decidi simplesmente não fazer nada, esperar a paixonite passar. Sabe, eu aceitei ser lésbica, e comecei a ler sobre o assunto, só não aceitei estar apaixonadinha pela amiga. Voltaram as aulas, a gente se abraçou e continuou a vida normalmente. 
Quase. Justo nessa época saiu na Veja aquele texto sobre cabras e espinafre (aquele!) e eu, já lésbica o suficiente pra me sentir completamente ultrajada, li várias críticas (incluindo a sua, Lola, e foi aí que eu descobri o seu blog e virei feminista (Awn!) e mandei pra D. pra ver qual seria a reação. E foi a melhor possível. 
As minhas conversas com ela passaram a ser mais "sérias"; a gente virou feminista juntas, e começamos a descobrir (e criticar) a homofobia, o classismo, o machismo, o racismo... A gente se entendia perfeitamente. E fomos evoluindo, uma ajudando a outra. Acho que foi aí que nos grudamos de vez. Muita gente perguntava se éramos irmãs, e muita gente brincava que éramos namoradas.
Enquanto eu estava quase que completamente apaixonada mas ainda negando até a morte, apareceram outros na disputa (é claro, romance adolescente só vira história se for triângulo amoroso, né). Beleza. I can do it. Mas foi só quando (nesse carnaval) ela ficou com um cara (mais um vampiro, já que o cara tem 300 anos. Opssss, recalque) que eu percebi que a) gostava mesmo dela e b) tinha que fazer alguma coisa, senão nunca ia dar nada e eu ia me culpar pro resto da vida.
Resolvi falar. Pensei que não tinha como eu ficar pior. Se ela não gostasse de mim do mesmo jeito... Bom, problema dela. E falei. Gaguejando e quase chorando, mas saiu. “Olha, não sei se você percebeu, mas eu sou meio que lésbica. E eu... meio que... gosto de você”. Bem romântico. E aí começou a conversa mais aberta que eu já tinha tido até então. Foi como se a última parede entre nós tivesse ruído. Foi libertador poder falar em voz alta como eu era sapatão mesmo, como gostava dela mesmo, como tinha percebido, como tinha aceitado e como tinha criado vergonha na cara o bastante pra falar. 
Eu gostaria de dizer que nessa hora nós nos olhamos nos olhos e nos beijamos apaixonadamente. Eu gostaria, mas... sinto muito te desapontar. Ela me enrolou dias e mais dias. A eterna história de "Será que estraga a amizade?". Ok. Duas semanas depois (Duas. Semanas.) nós ficamos, numa sessão de cinema inesquecível não só pra nós como também para os garotos do nosso lado. [Notinha curiosa da Lola: Quero saber o filme!]
E estamos juntas até hoje. Ainda no processo de aprender e evoluir juntas. Nós não somos “assumidas”, só pros amigos mais próximos, mas teria que ser cego pra não perceber alguma coisa. As fofocas já correram pela escola e, olha só, os amigos machistas e homo/lesbo/trans/bifóbicos até que começaram a repensar um pouco.
Da minha parte só posso dizer como é maravilhoso olhar pra pessoa do seu lado e saber que ela não apenas te aceita ou tolera, mas te entende. Numa das cartinhas que escrevi pra ela (ah, o amor juvenil) eu disse: “Nós não nos completamos. Nós duas somos inteiras. Só precisamos da outra pra perceber isso” ou algo assim. E realmente acho que isso é um ensinamento válido, mesmo partindo de uma garota de 16 anos.
E, Lola, se é pra falar de visibilidade lésbica, acho que não posso falar nada. Afinal de contas, eu e D. não somos visibilizadas. Duas adolescentes menores de idade completamente dependentes dos pais. Nós nos escondemos. Da família, dos amigos, de conhecidos que talvez estejam perto e não podem nos ver, e até de desconhecidos. 
Vergonha? Não, jamais. Medo? É, talvez um pouco. Ou quem sabe nós só estamos esperando o momento certo pra chegar com nosso caminhão passando por cima de todo preconceito.

53 comentários:

Anônimo disse...

Meu comentário não tem nada a ver com o conteúdo, mas só queria dizer que gostei bastante do jeito que a autora escreve!

Lucas disse...

Realmente a mocinha escreve muito bem, na idade dela não sei que desgraça ia sair se tentasse escrever algo assim rs

E é engraçado olhar pra trás e ver como tanta coisa acontece quando você é novo. Tipo, elas estão apenas alguns meses juntas mas tem uma puta história sobre isso. Achei fofo rs

Boa sorte aí, moças =)

Ana Carolina disse...

SUAS LINDAS! Só desejo felicidades.

E um comentário que vale para todos: é muito, muito bom ver que garotas de dezesseis anos já sabem que amor existe entre pessoas inteiras. Que não existem metades, existem inteiros. Tendo essa noção, a vida amorosa de vocês vai ser muito mais saudável. E de todos. Pois todos deveriam internalizar isso...

Bia G. disse...

E viva o amor! <3

Miguel disse...

De certa forma, isso também é visibilidade, também ajuda a derrubar preconceitos. Elas podem não ser "assumidas" (detesto essa palavra!) pra sociedade inteira, por n motivos, mas se conscientizam de alguma forma os amigos mais próximos, não deixa de ser louvável!

E deu pra me identificar muito com o relato. Só que, no meu caso, a grande revelação que eu tive que fazer pra minha amiga era ser trans rs. Mais uma vez, muitas felicidades e mais sessões de cinema pras duas! E curtam mesmo, porque quando a gente é adolescente dois meses são uma vida inteira.

Anônimo disse...

I feel dizzy after my lunch

Anônimo disse...

É a coisa mais nojenta que já ví. A civilização ocidental já era.

Anônimo disse...

Lola sua linda não deixe o bloguinho. A Ana Carolina e o Miguel falaram tudo. Sonho com o dia da visibilidade para todos, Bj grande

Anônimo disse...

Que legal essa experiência!! Tudo de melhor para vocês, suas lindas!

WICKED WOMAN disse...

Desejo tudo de bom pra vc's e muita força, pq a batalha ainda está começando... Pelo que parece, são duas guerreiras super decididas e apaixonadas e vão tirar de letra qualquer preconceito idiota.
VIVA O AMOR!!!!!!!!

Unknown disse...

"não nos completamos. nós duas somos inteiras" é um belíssimo ensinamento para todo casal.

é que em breve sejamos todxs inteiramente livres de todos preconceitos. eles são tão ... inúteis :)

Anônimo disse...

Parabéns pras duas! Lindas palavras, viu?! Eu não entendo muito sobre se descobrir homo ou bi, pois sempre soube, sempre foi muito clara, pra mim, a minha condição afetiva/sexual.(Mesmo porque, quando sua sexualidade é "visível", alguns fazem questão de te "lembrar" disso!) E, gente, quando falo "condição", tô dizendo que tudo está dentro de nós, nada está externo, e é "empurrado" pra dentro de nós, como tantos pregam. Acho que tudo tá dentro da gente e, com as experiências que temos, são despertadas. E viva o amor que faz bem, que não oprime, fere ou machuca... =)

Anônimo disse...

Bom, o texto é legal, sim. Se elas tem consciência da opção que fizeram, se é essa a forma de felicidade, se o amor entre iguais é a maneira de se atingir a plena realização amorosa, então viva! Mas será que ais 16 anos alguém ja cabe em rótulos? Especialmente alguém que ja manifestou interesse pelo sexo oposto? Será que nao é precipitado fechar outras portas na vida, tão cedo?

Anônimo disse...

Percebo que há hoje entre os adolescentes certa glamourização da homossexualidade. É cool ser gay. Se a pessoa é gay de verdade, ótimo que se assuma e se removam os preconceitos! Que cada um viva o que é de verdade! Mas é indiscutível que a vida do homossexual ainda hoje é mais difícil. Nao da pra negar... Como mãe, meu caminho seria respeitar, sempre. Mas não fomentar. Não sou hipócrita em dizer que não desejo pros meus filhos o caminho mais fácil na vida. Alias, qualquer mãe, se pudesse, certamente eliminaria qualquer sofrimento, qualquer obstáculo que seus filhos pudessem encontrar na vida. Então, para mim, uma coisa é certa: se perceber alguma inclinação em um dos meus filhos, respeitarei sua escolha, a abraçarei de corpo e alma. Mas jamais fomentarei. E acho que essa onda cool tem que ser suavizada, para que se respeitem as escolhas genuínas.

André disse...

Se as famílias forem retrógadas é melhor ficar na miúda até terem independência financeira. Se forem liberais também não tem necessidade de comunicar solenemente a homossexualidade, assim como os heterossexuais não fazem isso.

Anônimo disse...

lindo relato! M. você escreve muito bem e tem uma sabedoria singular para alguém tão novinha!
Boa sorte para vocês duas, é tudo o que eu posso desejar. Queria também desejar que vocês vivessem em um mundo no qual pudessem revelar esse amor sem medo, mas eu sei que não podem e compreendo. Aprendi a compreender vivenciando as experiências de várias amigas lésbicas. é difícil mesmo. Mas, vai ser cada dia mais fácil!!!

queria pontuar outra coisa: a M., em nenhum momento, sentiu que a D tinha colocado ela na tal da "friendzone". Acho que isso mostra como esse expressão horrenda é uma coisa mesmo masculina. Os meninos inventam isso pois sentem que eles tem "direito" a "ter" a menina que eles gostam. Lamentável, meninos. Aprendam com a M.!

aiaiai (ainda não estou conseguindo postar como aiaiai...)

Rafael Franco disse...

Muito bom o texto da moça! Gostei muito da história e ela escreve muito bem. Espero que sejam felizes <3

Marina disse...

Achei lindo, lindo, lindo... E continuem no armário, meninas. Não saiam daí até terem 18 anos. Quem disse que ser invisível só tem desvantagem? Invisíveis, vocês estão seguras, pelo menos até a maioridade. Preservem-se do preconceito, protejam-se da crueldade dos colegas de escola e de alguns familiares homofóbicos. Sim, eles existem e são quem vicês menos esperam, viu? Fujam da dor até estarem amadurecidas o suficiente para encará-la de frente. Porque ela virá, meninas. A dor é quase uma certeza, porque estamos num mundo intolerante e violento, que não suporta meninas que amam meninas. Cuidado com a maldade, meninas! E celebrem esse amor invisível, porque, nesse mundo tão frio e tão duro, o amor é raro, raro, raro... É quase um milagre!

Feminazi Satânica disse...

Que história lindaaaaa, adorei!:*D

Muita sorte e felicidade para vcs. Que vcs continuem assim sempre amigas, companheiras, cúmplices e apaixonadas.

Natascha Fontanesi disse...

Falando em Visibilidade, eu andei percebendo uma coisa aqui no meu trabalho.
Eu sou sapatão, assumidissima e td mundo conhece minha namorada, dai tem mais duas meninas que também são: uma super no armario, e outra que acabou de se descobrir.
E é engraçado a diferença no tratamento, comigo (aparentemente) td leva na boa, age com naturalidade quando falo da minha namorada, só que essa que se descorbiu agora tão caindo de pau nela, que isso é fase, que ela deveria ser mais discreta, todo mundo inconformado.
Não sei o que pensar direito sobre isso, mas acho engraçada a diferença no tratamento e nos comentários sobre nós, parece que existem categorias de lésbicas... nao sei

Lord Anderson disse...

Caramba, adorei o titulo do otimo post.

Um relacionamento é a soma de pessos inteiras que se fazem bem, se cuidam, estimulam a ser melhor, dão apoio e sentem tesão.

Isso sim da uma sensação de lealdade e cumplicidade que fortalece e faz feliz.

Jackeline disse...

Awww que coisa mais linda esse post.
Achei a moça bastante esclarecida (e escreve muito bem, sim). Relacionamento entre pessoas inteiras é a única forma de um relacionamento saudável existir. Acho que entender isso é algo muito, muito valioso.
Eu com 16 anos ainda acreditava no príncipe no cavalo branco huahuah.
Felicidade pras duas! <3

Beatriz Correa disse...

Achei lindo, demais <3

Eu aos 16 tava era longe de ter a cabeça que ela tem agora xDD

Espero que essas lindas tenham um belo futuro pela frente e que passem MESMO com um caminhão por cima do preconceito, o mundo anda muito precisado disso ^^

Layana disse...

Legal, eu sempre tive curiosidade em saber "como começa" com homossexuais. Pois quando se é adolescente há toda uma cultura que nos "ensina" como namorar, como chegar junto, como são as etapas de um namoro e tal. Mas quando se é homossexual tudo deve ser muito solitário não é mesmo?
Parabéns as duas meninas.

Patty Kirsche disse...

Ai que lindo!!! Tão romântico... rs <3

Jô Turquezza disse...

O que importa, na minha opinião, é a felicidade e o amor entre duas pessoas ...........
Queria ver o mundo todo feliz e amando!
Beijos.

Anônimo disse...

Que texto gostoso de se ler!Fiquei admirada com o talento da moça em transformar um assunto cercado de preconceito em algo tão delicioso de ler.

Mudando de assunto: vejam o texto mais nojento que eu li em minha vida, sério!E esse mané se diz geneticista!
“Homens podem ser culpados pela menopausa”: http://g1.globo.com/platb/espiral/2013/08/29/agora-esquentou-homens-podem-ser-os-culpados-pela-menopausa/#comments

Algum(a) geneticista leitora da Lola pra responder a esse babaca chamado Alysson Muotri?

Patrícia Nunes

Anônimo disse...

"É a coisa mais nojenta que já ví. A civilização ocidental já era."

Poxa Lola, desculpa aê, mas não publica uma desgraça de comentário besta assim.

Oô desgosto de ter que ler isso aqui.

Podia ter passado sem essa hoje.

Anônimo disse...

Bom, olha só: eu sou a M. No relato eu não podia ficar falando infitamente, então isso pode ter ficado meio estranho mesmo. A coisa com os garotos foi mais por 'costume', acho. Sabe, até a D. eu nunca tinha sequer pensado na possibilidade de ser lésbica. Só depois eu comecei a realmente observar o que me atrai, o que eu gosto, etc. E sobre fechar portas, eu já fechei todas, porque quando você está com alguém não fica pensando em qual a próxima pessoa que você vai namorar, né. Uma coisa que eu disse pra ela no dia que me "declarei" foi que não importa a orientação, só importava se nós nos gostávamos. Lésbica, bissexual, pansexual... eu nunca cobrei dela uma identificação. Mas eu acho importante você se identificar, pra começar a se perceber como parte da comunidade, se integrar (pra mim foi). Talvez eu não queira mais esse rótulo mais tarde, mas agora me faz bem dizer que sou lésbica, com todas as letras e enchendo a boca, até porque é comum "amenizarem" o termo substituindo por gay e tal. Enfim, é isso.

Natasha disse...

Lindo! =) Boa sorte para vocês!

Telma disse...

Tenho uma teoria. Quem já te conheceu homo, te coloca na categoria "nascida homo", mas a moça está na categoria " virou homo" e, ao contrario de você que não pode desnascer, eles acreditam que ela possa desvirar.

Bobões

Anônimo disse...

ESTUDANTE DA USP FOI ESTUPRADO POR TER OPINIÃO CONTRÁRIA AO HOMOSSEXUALISMO, VÃO IGNORAR ISSO?

http://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/noticia/2013/08/ex-aluno-invade-alojamento-da-usp-agride-estudante-e-faz-varios-disparos-usp-campus-sao-carlos.html

afrolesbofeminista disse...

Sim. Também gostei da história. E concordo com alguém (me desculpa, não lembro quem) que escreveu sobre a importância de se permanecer no 'armário'. Eu tenho 27 anos e sou 'assumida' há quase 10 anos, mas foi um processo doloroso. Meu pai descobriu, ficou sem falar comigo durante uns 8 anos e é muito difícil, muito mesmo. Sei que não existe uma idade ideal para isso mas enquanto se é adolescente, pode ser mais difícil aguentar a discriminação.

Mesmo com certa bagagem ainda machuca muito sofrer discriminação. No fim de semana passado por exemplo, estava passeando de mãos dadas com uma ficante, quando um grupo de homens começaram a falar um monte de bobagem e a falar alto. A primeira coisa que me vem à mente é de como se comportariam se fosse o casal hetéro passando por eles, com certeza seriam invisíveis. Isso é só um exemplo do que acontece constantemente.

Bom, que seja.

Boa sorte para as duas.

Dona Coisa disse...

Oi menina.

Adorei seu relato, tão maduro, tão seguro. Essa segurança que a gente tem de si aos 16 anos e que morro de saudades hoje, aos meus quase 35. :P

Quando eu tinha 13 anos (e era a tímida da turma) comecei a sentir umas coisas estranhas por uma colega. Era assim, uma necessidade enorme de ser amiga dela. Ela era toda popular e nós não éramos próximas. Eu nem respirava quando estava perto dela. Escrevi músicas, poesias. Sonhava acordada. Um dia resolvi que eu tinha que falar alguma coisa. Fomos conversar num canto. E eu me abri.

Na época eu abri tudo o que poderia abrir: que eu era LOUCA para ser amiga dela. Eu fiz discurso de apaixonada, mas não usei essa palavra porque, pra mim, não existia essa realidade. Eu era menina PORTANTO eu me apaixonaria por meninos.

Depois da conversa nos aproximamos. Ela tinha mil namorados e eu morria de ciúmes. Não sabia bem porque. Cada toque dela eu tremia toda. Eu chorava sozinha em casa.

Mas não aconteceu nada, não podia acontecer. Não existia homossexualidade nessa época. Não pra mim. Não no meu colégio. O mais próximo que tínhamos era um colega que chamávamos de viadinho porque... alguém resolveu que era legal chamar ele de viadinho e o fizemos durante anos (eu sofri e reproduzi bullying. Nao tinhamos ideia do que era).

Nessa época não tinha internet. E se tinha internet era pra entrar em chats, em bbrs. Trocar meia dúzia de emails. Abri minha primeira conta de email aos 16/17 anos. Fui uma das primeiras. Pra vc ver. E nessa época, informação a respeito de tais temas era difícil. Para mim, inexistente. Não sabia com quem conversar sobre aquilo. o que eu estava sentindo. Então esperei o tempo passar. e, bom, passou.

Uns dois anos mais tarde me apaixonei por um homem (como vc bem disse um vampiro com 300 anos de idade). depois por outro e outro e namorei anos com um deles. Acabou que a história dessa paixonite passou. ficou pra trás na memória. Mas a amizade com aquela menina continuou.

Bom, aos 24 anos, depois de terminar um relacionamento de quase 6 e ficar sozinha por outro ano inteiro um dia me vi tendo todos aqueles sentimentos confusos de novo... por outra amiga.


(continua)

Dona Coisa disse...


E lá fui eu sofrer tudo de novo. Fiquei confusa, não entendi nada. Eu já tinha contato com outra realidade. Fiz comunicação na faculdade e lá tinha bastante lésbica, bastante gay... um dos meus melhores amigos havia se assumido alguns anos antes pra mim. Então a desinformação já não era um problema. O que eu não entendia era como eu QUE GOSTAVA DE HOMEM, CARAMBA, estava sentindo tudo aquilo.

Fui acampar. Fiz uma trilha de 3 dias com um grupo de montanhismo do qual fazia parte. Um menino passou a viagem toda dando em cima de mim. Quanto mais ele dava em cima, mais eu pensava na amiga. Voltei decidida a contar pra ela e ver no que ia dar.

Contei e ela entendeu tudo, mas não era a dela. Nos afastamos a meu pedido, pois éramos muito grudadas e eu comecei a sofrer com isso.

Durante esse tempo eu achei que o que eu sentia era uma coisa específica com ela. Eu não era lésbica. Eu gostava de homem. Sempre gostei de homem.

Aos poucos o coração acalmou, mas eu me percebi diferente. Alguma coisa em mim havia mudado. Eu queria ficar com alguma mulher. Eu queria beijar uma mulher, saber como seria, como eu me sentiria na hora e depois. Com o tempo a curiosidade foi crescendo.

Abri o coração para alguns amigos próximos que frequentavam ambientes ou eram gays. Eles me levaram para alguns lugares (eu fiz o mesmo por eles, mesmo sem ser gay, anos antes quando eles sairam do armário), mas nada acontecia. Um dia uma amiga me convidou para uma festa na casa de um amigo viado (acho que foi esse o nome que ela deu) e eu fui.

Nessa noite eu comecei a conversar com uma moça a respeito do universo, buracos negros, buracos de minhoca, no universo em 4 ou 12 dimensões, sobre conceitos matemáticos que nem entendo e pimba! ela me tascou um beijo. O beijo começou na sala, passou por vários cômodos e terminou na cama.

Nesse dia descobri que gosto de meninas.
Gosto, amo, me apaixono, tenho tesão, me doo.

Depois disso passei algum tempo achando que só gostava de meninas, que era lésbica, pois me desinteressei totalmente dos meninos. Mas acabaram acontecendo algumas ficadas e consegui, um dia, aceitar que sou bissexual. Sou bissexual, mas as meninas me fazem mais feliz.

Hoje sou casada (esse ano farão 8 anos) com uma mulher incrivel que, como a sua namorada, me completa na sua integralidade. Ela é mais do que a mulher que eu amo. Ela é minha companheira, melhor amiga e muitas vezes mesmo minha colega de trabalho (somos freelancer e as vezes coicide de trabaljharmos juntas).


Algumas coisas que queria te dizer a respeito do maldito armário:

Saia no seu tempo. Nao aceite pressões e tente escapar de rótulos (embora, na adolescencia isso seja MUITO complicado).

Tenha calma com seus pais. Cada um reage de um jeito e, embora ser homossexual (ou bi, ou qq outra coisa) não seja diferente se ser hetero, para as gerações anteriores ainda é. Então, quando vc achar que é a hora, conversa, mas vai com calma.

Minha conversa com minha mae foi horrivel. Ela é um ser iluminado e, tirando a homossexualidade, não tinha preconceito com coisa nenhuma. Passou anos achando que eu estava vivendo uma adolescencia tardia, que era modinha, que ia passar. Ela não entendeu na hora e demorou muito para que entendesse. Mas hoje ela e minha namorada são super próximas e ela se interessa muito pelo assunto, mudou totalmente de cabeça e atitude. Meu pai tratava minha namorada com cara de nojo. Para que ele aceitasse ela eu parei de falar com ele por mais de um ano. Depois que minha vó faleceu ele resolveu se reaproximar e resolveu adotar minha namorada como filha. Hoje tá tudo bem, mas o processo é doloroso. Por isso eu digo: calma.

De resto, parabéns pelo relato, pela maturidade e pelo seu amor. Vc, além de tudo, tem muia sorte.

Beijão!

Lígia disse...

Nossa, quanta lucidez para uma menina de 16 anos!

E quanto talento, pois a história é linda e foi muito bem contada!

Amei!

Anônimo disse...

Parabéns pelo Guest post e tamanha lucidez e maturidade aos 16! E adorei a história da Dona Coisa também!

Maíra disse...

Muito bacana esse post para o dia da visibilidade lésbica, Lola!

Fiz um texto para a minha coluna no site de cultura lésbica "True Love" abordando um tema que ainda é pouco enfatizado: a educação sexual de mulheres lésbicas!

Poucas campanhas são feitas para incentivarem métodos de prevenção de DSTs entre as lésbicas, o que é bastante grave e, na minha opinião, um problema de saúde pública no Brasil! Falo um pouco sobre isso no meu texto, sobre como a maioria das campanhas são voltadas para os casos onde existe a figura masculina no meio (sexo heterossexual ou entre homens gays), mas pouco se fala de sexo entre mulheres (porque, né, tem gente que nem considera isso sexo!!!).
Lola, gostaria de sugerir esse tema para um post no seu blog, porque acho que tem muito a ver com o machismo!

Deixo aqui o link para o meu texto, caso alguém se interesse sobre o assunto: http://truelove.com.br/2013/08/educacao-sexual-de-mulheres-lesbicas-e-bissexuais/

Denise disse...

Texto lindo, maduro, fofo! <3

Queria muito ver o dia em que não vai fazer diferença alguma se o casal é composto de pessoas do mesmo sexo ou não, desde que haja amor. :)

Anônimo disse...

Estupradores com direito à vista e custódia nos EUA:
http://www.slate.com/articles/double_x/doublex/2013/08/montana_massachusetts_rape_cases_when_judges_can_t_get_even_the_easy_cases.html

Anônimo disse...

Vitor,

esse aluno da USP foi em realidade cercado por veteranos que fizeram uma "brincadeira" de conotação sexual em uma festa. Gritaram baixarias e baixaram as calças. Concordo que o que ele sofreu é abuso, agora quando a Lola postou aqui aqueles posts criticando os trotes que são tradicionalmente feitos com as alunas bixo, aí dizem que não é abuso, que é "brincadeira", que elas participaram porque quiseram. O fato de tu, como homem, te sentires tão ofendido com o que fizeram com o aluno - o que, de novo, concordo que foi abuso - somente realça a falta de empatia que existe para com as mulheres que criticam os trotes. E essa falta de empatia não é nada mais que um eufemismo pro mais puro, simples e porco machismo que está tão arraigado nas nossas relações sociais.

Anônimo disse...

Aliás, ainda na linha do comentário do Vitor e sobre o caso da USP, acho ótimo esse trecho da entrevista com o estuadante: "Acho que isso é uma forma de mostrar que existe uma hierarquia, os veteranos mandam e os calouros têm que obedecer tudo o que eles quiserem. Se houver mais denúncias, talvez isso possa ser questionado um dia". Fica extremamente claro como o abuso sexual é sobre poder, e não sobre seres humanos descontrolados que não conseguem segurar seus impulsos...

Lucas disse...

Dona coisa, me passa seu endereço que eu vou mandar entregar um coração do tamanho de um bonde aí pela sua história.
<3

Nati disse...

Nossa, que fofíssimas!! Lindas! E que escrita deliciosa e interessante, e com 16 anos?!!
Arrasou garota!!
Tenho 32 anos, o dobro da sua idade, rs, não tenho filhos, mas quero ter um dia, e se tiver uma filha menina, espero que ela seja assim como vc, inteligente, arguta, esclarecida, bem articulada, que orgulho deve ser ter uma filha assim com essa visão de mundo tão esclarecida e sendo tão jovem...
Lindíssima!
Beijos e sorte.

Anônimo disse...

Uhum, só eu que não botei fé?
Si não, tá com cara de modinha...
Já conheci algumas, especialmente nessa idade ae, que se diziam lésbicas e talz.
Mas no final, era apenas modinha p pagar de descolada.
Acabaram que voltaram a namorar homens quando a vida real tocou o sino.

Nati disse...

kkkkkkk, muito engraçado o comentário acima, "vida real tocou o sino", que bom que alguém neste mundo detêm a sabedoria suprema do que é "A VIDA REAL"..., acho esses comentários engraçadíssimos..., como se a vida real fosse uma coisa óbvia e estivesse ali na nossa frente, só esperando a "modinha da vez" passar e então começamos a "vida pra valer"! rsss, risível, no mínimo...
Lola querida, veja essa noticia bizarra:
http://oglobo.globo.com/blogs/pagenotfound/posts/2013/08/28/cirurgiao-plastico-esculpe-mulher-perfeita-se-casa-com-ela-508515.asp

Maíra disse...

Anônimo do comentário "romance lésbico é modinha", tenho uma história para te contar: eu e a minha esposa nos conhecemos pela internet aos 16 anos, morando em cidades e estados diferentes. Nunca havíamos namorado mulheres antes e enfrentamos todas as dificuldades imagináveis para ficarmos juntas! Saí da casa dos meus pais aos 18 anos para fazer faculdade e ficar perto da minha namorada. Minha sogra, na época, dizia a mesma coisa que você (que era fase e que ia passar).

Só sei que a "fase" já dura 12 anos, atualmente temos 29 anos, moramos juntas há 7 anos, somos um dos casais com relacionamento mais longo, estável e harmônico da família e planejamos ter um filho em breve.

Lésbicas existem e vivem muito bem e felizes sem homens, colega! Aceite isso e seja feliz também!

Miguel disse...

Só um comentário pra Anônima das 14:14. Eu pretendo ser pai muito em breve e, embora entenda sua colocação perfeitamente, discordo. Se mais alguma alma tiver que encarnar nesse mundo e ser homossexual, por favor, que essa alma seja meu filho ou minha filha. Porque eu sei que eu e minha namorada - futura esposa - daremos todo o amor, compreensão e carinho que essa pessoa merecer, ao contrário da esmagadora maioria das famílias.

Aline disse...

Oi Lola, leio seu blog há um bom tempo, quase todos os dias, e desculpe falar de outro assunto aqui, mas só queria dar uma "dica": sempre que estou lendo e tem algum link (como nesse post, por exemplo pra reportagem tosca da veja), ele sai da sua página e vai pra outra.. só pela praticidade mesmo, seria interessante colocar o link pra abrir numa nova janela/aba. Acho que qualquer pessoa mais "entendida" de computador consegue te dar um help nisso!
Adoro seus textos, continue com o blog sim! =)
Beijos!

Anônimo disse...

Lola,sobre os selinhos masculinos, o tal galã adolescente da One Direction (lindo e rotulado de womanizer) tá causando porque beijou um amigo,que é apresentador de um programa na TV inglesa! Vai ao ar hoje, então pode esperar rebuliço no meio adolescente! Na mesma linha da M e da D, acho que essas questões precisam ser sempre meio de os adultos se informarem sobre a forma com que o 'mundo teen' encara essas questões (sempre aquela polícia moral de Associação dos Pais julgando algo não adequado). Olha só como a internet foi uma parte importante da descoberta da M.!
Sou fã do seu blog, beijos

Rafael disse...

Essa semana aqui em Vancouver assisti uma montagem de Romeu e Julieta em um parque público, só que o Romeu era uma mulher (e o texto teve os artigos adaptados para condizer com o fato). Não mudou em nada o romantismo e a tragédia da história. Foi ótimo (e difícil pra caramba de entender esse inglês Shakesperiano).

Unknown disse...

Gostei bastante do texto, conteúdo e forma. Fiquei feliz por a 1ª experiência homossexual da autora ter sido com uma pessoa de quem ela gosta. A minha 1ª experiência, não só homossexual, mas sexual (até então eu era completamente virgem), aconteceu quando eu tinha 22 anos, com um cara com quem eu teclava pela internet. Foi tão sem graça (bom, tão sem graça seria exagero. Foi só sem graça)... Passei por constrangedoras interrupções no funcionamento das partes localizadas abaixo da cintura todas as vezes que a gente transou (passamos o carnaval de 1999 juntos, em Salvador). O que eu gostei mais foi do beijo na boca. Acho que meu último beijo na boca, até então, tinha acontecido por volta dos meus 05 anos de idade, na época em que eu brincava de médico, com toda a inocência da infância, com minha única namoradinha-mirim, que tinha a mesma idade. Quando voltei pra casa, em Aracaju, meus lábios estavam despelando. Só fui perceber que a pele dos meus lábios era tão tenra com essa descamação. Até as bocas perdem a virgindade, a minha perdeu naquele carnaval de 1999. É, o beijo dele era muito bom mesmo. Um dos melhores que já experimentei até hoje (rs). Naquela época eu era tão inexperiente, sexual e afetivamente falando, que voltei pra casa apaixonado. Sofri horrores por ele não ter me dado a mínima. Ainda tive que ouvir um "Pare de encher meu saco. Eu nunca te escondi que seria só sexo". É, ele realmente não tinha me iludido. Só me restou chorar um tempo, de cuja duração nem me lembro mais, até aquele rapaz (faz 40 anos este ano, em outubro, até gravei o dia do aniversário dele) ser eliminado da minha pele (infelizmente tenho facilidade pra cantar I've got you under my skin... Mas hoje em dia felizmente já separo sexo de afeto quase que muito bem). Quanto a se assumir, realmente é difícil. Estou com 36 anos e ainda não consegui me assumir socialmente. Minha família sabe, meus amigos também (são muito poucos. Se não me sentisse à vontade para dizer a elxs, não diria que são meus amigxs). Os héteros não precisam passar pelo constrangimento de explicar e dizer socialmente "Olha, eu sou heterossexual, é da minha natureza. Desculpe-me, viu? não foi nem por bem, nem por mal, simplesmente aconteceu". Então por que eu tenho que passar por isso?! Mas a invisibilidade pode ser muito dolorosa. Hoje faz 30 dias que chegou ao fim meu relacionamento de 03 anos, 09 meses e 17 dias. Durante todo esse tempo, ninguém da família dele, ou nenhum amigo heterossexual dele, soube da minha existência. Ele só contou a 02 amigos gays, mas que não são os amigos de que ele mais gosta. Dei o livro da Lola de presente a ele e ele me pediu para guardá-lo aqui em casa, para não haver riscos de alguém da família dele ler, lá no apartamento que mantínhamos juntos, a dedicatória que Lola escreveu (ninguém da família dele, ou amigos, mesmo os 02 gays que sabiam da gente, ficou sabendo que aquele apartamento era de nós 02. Até hoje pensam que era só dele...). Eu me sentia meio como aquele livro, guardado numa gaveta da vida dele. Devolvi tudo dele que estava aqui em casa, menos o livro da Lola. Primeiro porque não li todo. Segundo porque gosto do livro. Terceiro porque o relacionamento a que a dedicatória faz referência já não existe mais. O livro da Lola é uma das mais valiosas lembranças, para mim, de um passado recente que ainda me é muito caro. E de um luto que ainda está em fase de elaboração.

Anônimo disse...

Adorei a história. Tud'bom pr'ocês, meninas :)

Eu também já me apaixonei por 1 amiga e tive várias dúvidas sobre minha sexualidade. Hoje digo e sinto que sou lésbica. Grande parte da minha família sabe e aceita, mas muitos pensam que é fase. Bom! Se for fase, que seja eterna enquanto durar. Haha!

Que continuemos a expandir a visibilidade lgbt! Tô fazendo minha parte ao discutir o assunto sempre que alguém mostra interesse em saber meu ponto de vista e cada vez mais confronto conhecidos que fazem comentários homofóbicos.

Força a tod@s!